Sunday, June 26, 2005

Morte vermiforme

Num fígado tomado pelo verme,
hepatófago ser das tenebrosas
noites em bodegas - Com suas grosas,
esse ser vil alcança a epiderme.

Vislumbra, então, o mundo descoberto.
Altivo, vê o mundo à sua frente.
Orgulhoso e encantado, nem sente
o espírito da Morte que está perto.

Avizinha-se, pois, essa tal Morte,
rápido algoz. Promete em um só corte
vindimar a vida do hospedeiro

do verme... Mas tem um coração mole:
antes de arrebatá-lo por inteiro,
deixa-o tomar um último gole.

Sunday, June 19, 2005

Consulta

-É um tumor vizinho do pulmão.
-O que faço, doutor?! O que é que eu faço?!
-É caso grave... É um grande freimão...
-Então corta a carne! Pega do aço!

Arranca esse caroço do meu peito!
Esse deve ser o único jeito...
Não posso morrer assim, sou um Homem!
-Logo, logo, ele chega ao abdômen...

-Que tamanho tem isso, doutor?! Mede-o!
-É grande o bastante para enterrar-te...
Preso à fina força e com muita arte.

-O que faço, doutor?! Verdade crua...
-Faz nada, amigo. Já não há remédio...
Tu és da doença, e a doença é tua!

Saturday, June 18, 2005

Último sopro de um semivivo

Imerso em lamacento beco escuro,
com as carnes furadas pela faca.
Seu maior apetite: uma maca
que o leve ao mais próximo monturo.

As moscas fazem casa em cada furo.
Os vermes já afinam a estaca
que estacará no peito feito placa.
Ainda tenta apoiar-se no muro,

o sacerdote da unção final;
o médico da derradeira ausculta...
Jamais alcançará o hospital.

Na melhor das hipóteses, um bar.
Assim como nós, ele morrerá
antes mesmo de chegar à consulta.

Sunday, June 12, 2005

Rondel da Rapunzel

Para Camila Cavalcante Ribeiro, a Rapunzel

Quando os versos de um rondel
saltarem por uma janela,
a mesma janela da cela
impiedosa à Rapunzel,

as cores tropicais da tela
pintarão de betume o céu.
Quando os versos de um rondel
saltarem por uma janela,

mesmo sendo a de um motel,
Rapunzel e as tranças dela
içarão um qualquer donzel
à uma torre de Castela.
Quando os versos de um rondel...

Saturday, June 11, 2005

Libação

Para Ana Luiza Noronha Lima, uma certa loulou de boulevard

Com uma doce e sumarenta lima
misturada à beleza de Noronha,
nasceu uma saborosa fruta inconha:
a menina que o soneto sublima.

De um lume sem par na natureza,
de presença brilhante qual luzerna,
é, decerto, o deleite da caserna
quando passa marchando, essa princesa.

Tem requinte de mais de cem mil gueixas,
aroma delicioso de lírio.
Se apenas desfralda suas madeixas,

é capaz de nos levar ao delírio.
Se a sorte nos brinda com uma trança,
somos lulu num colo de criança.

Saturday, June 04, 2005

Acróstico à minha futura esposa

Para a belíssima Aline Vasconcelos Parente, minha futura esposa.

A moça mais doce de todo o universo
Ler e traduzir teu encanto voraz
Ilustrar teu garbo solene e salaz
Não sei se é possível fazê-lo em verso

Elogios de um poeta sem talento
Pretendem louvar tua lubricidade
Ao menos zumbir à tamanha beldade
Razões para um futuro casamento

Enquanto tu pensas na minha oferta
Nas noites em claro de longas conversas
Teço poesias, em amor imersas

Eu, galanteadorzinho que te flerta

Sabedoria


Para Ana Sofia Cavalcante Pinheiro, Tenente-Coronel

Sobre a encarnada pista de corrida,
desfila airosa moça militar,
seguindo o seu destino: comandar
a tropa da escola reunida.

Bradando o hope-hope inconfundível,
nos guia como rígido sargento,
nos suporta qual lombo de jumento
na caatinga voraz e invisível.

De alambiques do seco Ceará,
em goles de cachaça embebida,
torna mais suportável nossa vida,

tão sofrida peleja de estudar.
A TC do colégio mais querida:
Sofia, cujo destino é voar!